top of page
Buscar
  • Christiane Brito

Na árvore dos sonhos com meu pai


Sem dúvida, a proximidade da morte física, seja por conta de uma doença fatal ou do envelhecimento, exige um eficiente exercício do desapego. Exercício consciente ou inconsciente.

Meu pai aos 76 anos, a três meses da morte por um câncer fulminante – sentença fatal que supostamente ignorava --, me pedia para interpretar os sonhos perturbadores que costumava ter naquelas noites.

Importante dizer que não sou psicóloga ou psicanalista, nem tenho qualquer certificação profissional no estudo de sonhos; sou apenas uma curiosa jornalista que leu demais, inclusive Freud e Jung. E, naquele tempo, não estudava ainda gerontologia.

Voltando aos sonhos do meu pai, a maioria deles tinha “viagem” como tema e um deles, extremamente revelador, falava de uma viagem qualquer em que meu pai, na volta, encontrava a escrivaninha em que trabalhava ocupada por um colega, que lhe tomava também, por extensão, o emprego.

Esse sonho tomou-nos bom tempo de conversa. Suponho que aprendíamos juntos, ele mais do que eu porque morreu muito mais sábio do que viveu. Conseguiu desapegar-se, inclusive, do medo da morte que sempre demonstrara.

Trouxe meu pai para esse artigo porque quanto mais envelheço e convivo com idosos, mais percebo a dificuldade de desapego em relação a objetos e sentimentos, pessoas, em última instância, a dificuldade de desapego da vida.

Perderemos tudo e já sabemos disso desde sempre, porque somos mortais. Sabemos intelectualmente porque afetivamente não sabemos de coisa alguma. Aliás, percebo como a acumulação de objetos se acentua com a idade.

Eu, por meu lado, depois de perder o meu pai nesta vida, percebi que eu estava mais "elevada", mais entrelaçada à frondosa árvore de companheirismo que nós dois havíamos compartilhado até o último dos seus dias.

É uma árvore feita de sonho e sentimento, invisível para o mundo, mas eu a escalo cada dia mais para chegar perto dos que amo. Quanto mais aprender a amar, mais alto chegarei, embora já saiba que nunca tocarei os pés nas nuvens porque que esse "aprendizado (o amor) não se esgota em uma existência", como me explicou o poeta Carlos Drummond de Andrade em uma linda carta.

fonte: explorindoyourmind.com

31 visualizações0 comentário

Posts recentes

Ver tudo
bottom of page